Crédito imagem: © António Araújo
Queridas Senhoras,
aproximamo-nos do final deste ciclo de entrevistas a escritores. Como já terão dado conta, convidámos pessoas com quem temos algum tipo de ligação especial. Autores que lemos e discutimos aqui no blogue, que nos acompanharam em fases importantes da vida, de crescimento, mudança, transformação interior, procura e aprofundamento de caminhos alternativos.
No caso do penúltimo convidado, o escritor açoriano Joel Neto (n. 1974), a ligação é também pessoal. Tanto eu como a Marta tratamo-lo por tu. Aliás, a Marta escreveu-lhe uma carta aberta sobre a leitura de Arquipélago (2015, Marcador).
Este romance, situado na ilha Terceira, aclamado pelos leitores e pela crítica, colocou o autor nos tops de vendas nacionais e foi descrito como “o regresso do grande romance açoriano”. Passado um ano, algo de semelhante aconteceu com A Vida no Campo (2016, Marcador), colectânea de crónicas originalmente publicadas no Diário de Notícias (prosseguem a um ritmo semanal, ao domingo) que relatam o quotidiano do seu regresso a casa (ao lugar dos Dois Caminhos, freguesia da Terra Chã, ilha Terceira), após duas décadas de vida na capital, onde chegou para estudar no início dos anos 90. Sobre essas crónicas, que me encantaram desde o primeiro dia, escrevi aqui e aqui.
(Devo referir que o Joel foi também a primeira pessoa a notar o meu interesse pelo mundo dos livros e da edição, tendo incentivado e acarinhado essa tendência de uma forma decisiva para o percurso que estou agora a seguir).
Jornalista desde os 20 anos, Joel Neto estreou-se na literatura com o romance O Terceiro Servo (2007, Porto Editora). Seguiram-se o livro de contos O Citroën que Escrevia Novelas Mexicanas (2007, Porto Editora), a colectânea de crónicas Banda Sonora Para um Regresso a Casa (2011, Porto Editora) e o romance Os Sítios Sem Resposta (2012, Porto Editora).
Absorvido na escrita do próximo livro (um romance passado entre a Horta, ilha do Faial, no tempo da II Guerra Mundial, e a Lisboa de hoje), com lançamento previsto para Maio deste ano, Joel Neto arranjou tempo para falar às Senhoras.
1. Um livro seu que recomendaria a quem queira iniciar-se na sua obra
Não sei se o autor é a pessoa mais bem colocada para responder à pergunta. Ninguém sabe muito bem que livros escreveu. Mas a resposta que me ocorreria sempre, certa ou errada, é Arquipélago. Do meu ponto de vista, todos os outros livros foram dar a ele. Até Arquipélago, parece-me, só tive um ciclo.
2. Três livros / autores fundamentais na sua existência
Conan Doyle, pela composição das personagens e por todos os caminhos que abriu no domínio da estrutura da narrativa. Steinbeck por aquilo a que em psicologia se chamaria “a jornada do herói” e pela preocupação perplexa com a desigualdade social. Saramago pelo fulgor narrativo e pelo trabalho da língua portuguesa. Mário de Carvalho pelo trabalho da língua portuguesa e pelo humor. E podia continuar por aqui fora. Podíamos todos.
3. Três livros que todas as crianças/jovens deveriam ler
Não tenho crianças e convivo menos com crianças do que gostaria. Em criança, li A Bíblia Sagrada – sou filho de protestantes. A Bíblia Sagrada não era sequer um livro: era um oráculo –, muito Érico Veríssimo, os primeiros Kunderas, o García Márquez. Deu no que deu. Na verdade, tudo dará no que der. Deixo as preocupações formativas a cargo dos pais. Por mim, o encontro de um livro (qualquer que ele seja) com um leitor (qualquer que ele seja) resulta sempre numa nova fórmula química. Não há receitas. É preciso é que leiam. Olha: leiam o Salinger, para perceberem que a revolta, a verdadeira revolta, não se pode dispensar da nobreza (o que invalida todas as revoltas de Facebook).
4. Um livro sobrestimado, que não merece a fama que tem
Se um livro tocou um milhar de corações e não tocou o meu, devo pelo menos admitir que o problema seja do meu coração. O resto deixo à crítica literária, para que não tenho competências. Já não tenho opiniões fortes. Quero ter cada vez menos opiniões fortes.
5. Uma sugestão cultural (filme, peça de teatro, concerto, exposição...)
A Carolina Rocha, artista plástica, tem neste momento uma exposição magnífica no Centro Cultural e de Congressos de Angra do Heroísmo. As Senhoras não gostariam de tirar umas férias?
6. Um programa e/ ou série de TV
Tenho visto muito pouca TV. Vi A Pecadora, mas foi-se degradando de episódio para episódio. Tentei ver Ozark mas era árida, tentei ver Happy Valley mas estava cheia de erros de anotação e implausibilidades. Tenho saudades de Shetland. Gostei muito daquela série islandesa que deu na RTP aqui há uns tempos, acho que Encurralados. Mas só vejo televisão ao fim-de-semana. Durante a semana, se estou com insónias, volto à sala e ponho um episódio antigo de House M.D. Era muito íntima. Adormeço em breve.
7. Uma livraria e/ ou biblioteca da sua preferência
A Livraria Solmar, em Ponta Delgada. É a livraria em que me sinto mais em casa. Sempre que vou a Ponta Delgada, visito-a nem que seja por dez minutos. Sabes que, nas nove ilhas dos Açores, só há duas livrarias em actividade?
8. Uma sugestão de leitura para as Senhoras da Nossa Idade (i.e. dos 35 em diante)
Um livro específico para mulheres? Para mulheres de meia-idade? Não me digas que o Bruno e o Valério caíram nesta.
Esta da meia-idade não deve ser connosco. :)
Beijinhos a todas,
Céu
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