Queridas Senhoras,
o Teatro dos Aloés tem em cena uma peça magnífica, com um texto maravilhoso, que recomendo vivamente. Danças a um Deus Pagão, do irlandês Brian Friel, está na Amadora e vai andar em digressão.
Um homem recorda o Verão de 1936 numa aldeia perdida nos confins da Irlanda. Ele era então uma criança e vivia com a sua mãe e tias. O ambiente é onírico, mágico, o rapaz faz de narrador presente e distante, relatando as memórias desse Verão decisivo em que tudo iria mudar e que, ao mesmo tempo, ficou cristalizado como um tempo de inocência e sortilégio.
As irmãs levam uma existência dura mas amenizada pelo convívio, pelas pequenas alegrias e, sobretudo, pela música que sai da telefonia, o “Marconi”, aquisição recente na casa que a todas enlouquece. O pai do rapaz é um pai ausente, que aparece a espaços, mas quando chega pega na mãe e dança com ela pelo jardim. Ela volta a ser menina e as irmãs, até a severa Kate, deixam-se contagiar pela leveza dos seus passos, pela beleza do par.
Há ainda um tio, o padre Jack, regressado de África após 25 anos de ausência. Vem esquecido de como se vive ali, o vocabulário falha-lhe e a sua religiosidade está impregnada dos rituais pagãos africanos, o que muito perturba Kate.
O texto é prodigioso, os actores estão em estado de graça e toda a encenação, a iluminação, a música, acentuam a ternura desse Verão passado, perdido, eterno.
Como as personagens, saímos da sala de olhos semicerrados (os meus vinham vermelhos do choro), a trautear velhas canções, abanando suavemente o corpo ao ritmo de uma telefonia distante.
Beijinhos a todas,
Céu
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