Os leitores falam às Senhoras: Helena Pitta (tradutora)


Queridas Senhoras,

tradutora literária de espanhol para português desde 1991, Helena Pitta recebeu o Prémio de Tradução Literária da Casa da América Latina em 2007 (pela tradução de Malinche de Laura Esquivel) e o Premio Internacional de Traducción Literaria Claude Couffon em 2011. Entre os autores que traduziu contam-se nomes como os de Arturo Pérez-Reverte, Carlos Fuentes, Eduardo Galeano, Eduardo Mendoza, Isabel Allende, Javier Cercas, Jorge Semprún, Luis Sepúlveda e Rosa Montero. Nasceu no Porto por acaso mas sempre viveu na Madeira. Confidenciou-nos que tem um «pequeno grupo de amigos muito bons» e que procura contribuir com a sua parte: «que la reseca muerte no me encuentre vacía y sola sin haber hecho lo suficiente».


1. O que está a ler neste momento?

Estou a acabar de ler O Paraíso e Outros Infernos, de José Eduardo Agualusa

2. O que leu antes e o que vai ler a seguir?

Bom, antes li Ya nadie llora por mí, de Sergio Ramírez. O que vou ler a seguir? Não faço ideia. A não ser que a referência a algum livro me deixe com muita vontade de o ler, o que costumo fazer é meter o nariz nas estantes e ver o que me apetece ler ou reler nesse momento.

3. Conte-nos uma memória de infância relacionada com livros

Numa das eleições anteriores ao 25 de Abril, não me lembro se nas de 1969 ou nas de 1973, a Oposição imprimiu uns postais com a frase: «Vote na Oposição Vote na lista democrática». Lembro-me de ver a minha mãe a escolher poemas para serem dactilografados no verso desses postais, que seriam depois deixados nas caixas de correio. Foi a minha estreia como dactilógrafa e foi também aí que percebi a força que podem ter as palavras.

4. Que livros marcaram a sua adolescência?

Na vila onde viviam os meus avós, e onde passávamos todas as férias, feriados e fins-de-semana, havia uma belíssima biblioteca da Gulbenkian. Éramos imensos miúdos e frequentávamo-la diariamente. Era um hábito passarmos pela biblioteca durante a tarde. E como éramos muitos e com idades muito próximas, os livros passavam de uns para os outros, levávamo-los para a praia, de manhã, e conversávamos sobre eles. Lembro-me de Morris West, de Erico Veríssimo, de Jorge Amado, de Graham Greene, de Romain Roland. Também devorei os livros do Maigret. E de Pierre Daninos, fartava-me de rir sempre que lia Os Cadernos do Major Thompson. Adorava banda desenhada, nessa altura havia a revista Tintin. Havia também muita poesia na minha casa. Depois do 25 de Abril deixámos de estar tão limitados pela classificação etária dos livros que requisitávamos e passámos para outros, para Hemingway, Tolstoi, Steinbeck, Zola, Bertrand Russel, Dostoievski, Gorki, Faulkner... E, claro, para os livros de formação política, obrigatórios nessa altura. Era uma biblioteca muito boa e lembro-me de que estava sempre a receber caixotes de livros enviados pela sede da Gulbenkian.

5. Um local público onde goste de ler

Adoro ler na praia. Hábitos da infância e da adolescência, acho eu. Também ajuda muito a maior parte das praias que frequento ser de pedrinhas e não de areia.

6. O seu recanto preferido de leitura (em casa)

O sofá, ao fim da tarde e à noite; a cama, antes de adormecer; uma varanda envidraçada com vista para o verde, durante o dia.

7. Uma biblioteca importante para si

A biblioteca Gulbenkian da minha infância.

8. As livrarias que costuma visitar

No geral, e desde que tenha tempo, espreito todas aquelas por onde passo, se bem que as montras sejam cada vez menos apelativas. Lembram-me um pouco a montra uma velha barbearia que havia no Funchal, quase em frente da Escola Industrial, onde se trocavam livros por alguns tostões: eram sobretudo romances de cordel e BD do Zorro, Fantasma e afins. Acho que ainda não tinham descoberto o filão da auto-ajuda. Em Madrid vou sempre às livrarias Iberoamericana e Juan Rulfo, tenho uma boa biblioteca de autores espanhóis e latino-americanos, apesar de nos últimos anos também me interessar muito a literatura da Europa de Leste sobre a época soviética.

9. Uma editora de que goste particularmente

Gosto cada vez mais das pequenas editoras, que têm catálogos muito mais interessantes, em minha opinião.

10. Que livros gostaria de reler?

Não consigo fazer uma lista. São muitos. Estou a reler muito do que li na adolescência. Mas há um autor a que tenho voltado com alguma frequência: Jorge Semprún.


11. Que livros está a guardar para ler na velhice?

Confesso que não estou a guardar nenhum em particular. Vou lendo o que me apetece.

12. Acessórios de leitura que não dispensa

Óculos e um marcador. Óculos porque já não consigo ler sem eles e um marcador, porque detesto dobrar as folhas dos livros. Há muitos anos que desisti do lápis, a minha capacidade de síntese sempre foi um desastre.

13. E se um livro não prende, põe-se de lado ou insiste-se?

Ponho de lado. Faço o mesmo com os filmes. A vida é demasiado curta.

14. Costuma ler sobre livros? Quais são as suas fontes?

Quase exclusivamente por razões profissionais e as fontes são variadíssimas.

15. Uma citação inesquecível que queira dedicar às Senhoras da Nossa Idade

Há uma frase de que gosto muito e que li há anos numa entrevista dada por Saramago: «A derrota definitiva é a resignação».





Beijinhos a todas,


Céu

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