Tudo em família

Queridas Senhoras,

ontem não tive oportunidade de publicar este post, mas conta como crónica de domingo, ok? A ver se fazemos por manter o ritmo que anda tremido.

Queria falar de dois filmes que vi este fim-de-semana. Ambos sobre a família, mas de tom tão diferente que um é quase antítese do outro.

Mães Paralelas, de Pedro Almodóvar, é um conto caloroso sobre a maternidade e a amizade entre mulheres. Penélope Cruz irradia amor, confiança, coragem. Grávida pela primeira vez aos 40 anos, cruza-se na maternidade com uma adolescente frágil e cheia de dúvidas. Os laços que então nascem entre elas, mulheres na mesma situação, mas em fases tão diferentes da vida, virão a tornar-se muito mais fortes do que elas poderiam imaginar. A cena em que a mais velha ensina à mais nova os segredos de uma boa uma tortilha parece evocar um historial de relações femininas, de mãe para filha, de avó para neta, de irmãs, amigas, companheiras.

Contos de um Verão Negro, dos irmãos italianos Damiano e Fabio D'Innocenzo. é precisamente isso, uma aterradora parábola sobre relações familiares e de vizinhança numa pequena comunidade italiana, durante um verão quente, em que os adultos são monstros mal disfarçados e as crianças não têm qualquer hipótese. A violência latente é terrível. Pais e filhos são completos estranhos, são como fantasmas que não se vêem nem se tocam. Crianças nascidas e por nascer estão condenadas, atordoadas pela falta de afecto, asfixiadas pela indiferença de adultos incapazes.

Foi coincidência ter visto os dois filmes um a seguir ao outro (Mães Paralelas estreou no cinema, Contos de um Verão Negro, que passou nas salas este Verão, chegou agora ao TVCine), o que me fez pensar num filme como o reverso do outro. No primeiro, há um forte sentimento de pertença familiar, mesmo quando a família tradicional está ausente. O desejo de maternidade sobrepõe-se a tudo, e a memória e a história familiar fortalecem a continuação de um legado. Obviamente, é uma história de mulheres, de força feminina, de luta feminista. (Veja-se a personagem secundária da mãe da adolescente, que procurou fugir à repressão familiar para perseguir o sonho de ser actriz, o que consegue já numa idade avançada). No segundo, a raiz do mal está na impossibilidade da vivência familiar, e a família tradicional, e patriarcal, surge como a mais terrível das ameaças.

Céu

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