Queridas senhoras,
Crónicas anteriores:
Nota: ilustração de Nathalie Jomard.
A semana passada falei-vos aqui do sono do bebé. Esta
semana começo por falar do sono dos pais.
O meu amigo Bruno costumava tomar relaxantes musculares para
conseguir dormir uma noite de jeito até que um dia teve gémeos e o problema
passou. Digo que passou no sentido que ele passou a ter sono, só que quando se
é pai ou mãe, ter sono e dormir são duas coisas que vêm em separado.
Serve esta curta história para quê? Para vos dizer que a
privação de sono é uma das faces negras da maternidade. Sim, a maternidade tem
muitas cores. Cor-de-rosa é apenas uma e geralmente a mais falada, por acaso.
Não é à toa que uma das torturas mais usadas com os presos
políticos era a da privação do sono. Em pouco tempo podem levar uma pessoa à
loucura. E por que é que com uma mãe isso não acontece?
A resposta dá pelo nome de ocitocina, também conhecida pela hormona da felicidade ou como
dizem os brasileiros “hormônio do amor”. É ela a responsável pela réstia de
sanidade mental que sobra a uma mãe e que lhe permite tomar conta das suas
crias.
É por causa dela que uma mãe pode ter sentimentos
ambivalentes na mesma hora: estar cansada até ao extremo mas também estar hiper
feliz. E aqui digo mãe e não digo pai porque a hormona não é produzida de forma
automática pelo homem aquando da sua nova condição de pai, tal como é produzida
por uma mãe no parto.
Um dos sábios conselhos que me deram na maternidade (tenho
recebido vários ao longo desta jornada) foi o seguinte:
- Dorme o bebé, dorme a mamã.
E dito desta forma parece tudo tão simples até que depois
esbarramos com a realidade.
E a loiça do almoço, quem é que a lava? E a roupa, quem é
que trata dela? E já nem me estou a referir a lavar vidros, limpar o pó ou
esfregar o chão. Refiro-me às tarefas invisíveis que se têm de fazer numa casa,
todos os dias.
A juntar a isto há as visitas. Sempre gostámos muito de
receber e de ter a casa cheia. É por isso perfeitamente natural que os familiares
e amigos mais próximos queiram ver o bebé nas primeiras semanas. Não dá para
responder:
- Agora não posso que estou a dormir.
Aos de perto de casa, tudo bem, se não dá jeito hoje visitam
noutro dia. Mas e o primo que vem do Norte, a família do estrangeiro que está cá de férias e o amigo que vive fora mas quer aproveitar a oportunidade para
conhecer o novo membro?
Alguém desse lado consegue ser descontraída o suficiente
para receber, ainda que seja família ou amigos próximos, com a casa suja e
desarrumada? E mais, sem ter nada para oferecer? Eu tentei sempre dar lanche ou
jantar mas confesso que tive muita ajuda nesse sentido.
Se aprendi alguma lição destes primeiros tempos? Sim, ao
colocar-me no lugar de futuros pais que estão fora da sua cidade natal e sem
família por perto senti-me aterrada. Por isso, da próxima vez que visitar um
recém-nascido vou eu levar uma refeição quente. Um tabuleiro de bacalhau que dá
para congelar depois as sobras, uma salada já lavada e pronta a temperar, um
pote de sopa caseira, uma cesta com fruta fresca… tantas as opções.
Não me posso esquecer que quando cheguei a casa da
maternidade tinha o jantar no forno e o meu bolo favorito na mesa. Se
gostei? Claro que sim. Cortesia da sogra. Ainda na
maternidade, uma grande amiga fez questão de me aparecer com caracóis e sushi
para o jantar, dois dos meus petiscos favoritos. Se comi o frango assado com
arroz do hospital? O que é que acham?
Posto isto, se tivesse de criar outro mandamento, este
dirigido essencialmente às visitas de famílias deslocadas, ele seria: “Não visitarás um recém-nascido à espera de
uma refeição na mesa. Traz tu a refeição para a nova família.”
É para isso que devem servir as visitas e não para fazer a
corte ou levar presentes. Em princípio a família já comprou tudo o que o bebé
precisa. Agora há que tratar dos pais. Agarrar na vassoura e limpar um chão, se for preciso e se houver confiança para isso.
É claro que isto soa tudo muito estranho a uma geração
anterior à nossa, mas faz cada vez mais sentido para famílias sem ajudas
externas. Muitas vezes, ou melhor, quase sempre, uma refeição quente é tudo o
que os pais precisam. O leite do bebé está sempre assegurado mas o jantar dos
pais nem por isso.
Ao contrário do que constantemente oiço dizer, para mim o
primeiro ano passou muito lentamente. As noites, quando passadas acordadas, são
intermináveis. Perde-se a conta se é dia, se é noite, num loop constante. Não
se sabe a quantas se anda e a perda de memória é uma das consequências mais
imediatas. Refeição a tempo e horas? Sabemos lá nós quando é que comemos pela
última vez…
Nos primeiros meses só conseguia jantar a partir das 23
horas. Há gente que está tão cansada que não janta sequer, vai directa para a
cama. Mas se o jantar tiver vindo à montanha, a coisa muda de figura…
Como é que eu sobrevivi? Aceitando a ajuda de toda a gente
com a mãe e a sogra na linha da frente. Afinal, como dizem os anglo-saxónicos, it
takes a village to raise a child.
E com as senhoras, como foi no vosso caso? Tiveram ajudas?
Até para a semana com o tema das manhas.
Crónicas anteriores:
Paula
Nota: ilustração de Nathalie Jomard.
Adorei 😍.... Mas refeições. ...😂
ResponderEliminar