Amamentação Ou como todos mandam nas minhas mamas




Queridas senhoras,

Esqueçam a quinoa, as bagas gogi, as sementes de chia e outros que tais. Para mim o único super-alimento que existe é o leite materno. O leite materno é um organismo vivo, adapta-se às necessidades do bebé ao longo do tempo e a sua composição “mágica” não só fornece os nutrientes necessários ao seu crescimento como ainda o protege contra infecções.

Os estudos a este alimento da ordem do “fantástico” não param de surpreender e hoje sabemos muito mais acerca dos seus benefícios do que há umas décadas. Talvez por isso cada vez mais mães, conscientes dessa benesse da Natureza, façam questão de amamentar os seus bebés nos primeiros meses.

Digo meses porque é cada vez mais difícil conciliar trabalho e amamentação. É difícil mas não impossível, atenção. Felizmente que são cada vez mais os grupos de amamentação com enfermeiras qualificadas à cabeça e depois há as doulas que podem prestar um serviço muito bom.

Amamentar não é fácil, nem para a mãe, nem para o bebé. O bebé tem de ser ensinado e nem sempre a mãe sabe como. Há histórias aflitivas de mulheres que quiseram dar de mamar e não conseguiram. Mamilos gretados, peito empedrado, bebé a bolçar sangue. Um horror.

É muito complicado inverter o estado das coisas quando nas maternidades o problema do fraco aumento de peso do bebé é “resolvido” rapidamente com recurso a fórmula, versão amostras individuais patrocinadas (?) pelas marcas. E quem é que patrocina o leite materno? Não será este um caso a ser tratado pelo Estado, não só por uma questão de saúde mas também de economia familiar?

- Ah eu não quero dar de mamar.

Está no seu direito. Faz com as suas mamas o que bem entender. E quem assim pensa não deve, de todo, ser alvo de julgamentos.

- Se não deres de mamar ao teu filho ele não cria um vínculo contigo.

Ai não? Então cria com quem? Com o carteiro que bate à porta de vez em quando para trazer uma encomenda?

- O filho da minha cunhada não mamou e só tomou antibiótico aos quatro. Já a filha da minha vizinha mamou e depois que entrou para a creche estava sempre doente.

O que dizer de comentários deste tipo? Que a conclusão é que é melhor tomar fórmula?

- O leite dela era fraco por isso o bebé não aumentava de peso.

Este é um dos maiores mitos relacionados com a amamentação. Não existe leite fraco. A Natureza é sábia. O que pode existir, entre outros factores, é um bebé que não sabe mamar e uma mãe que também não sabe ensinar. 

- Tu não vês que o bebé não está a mamar, só está a fazer do peito chupeta?

Quem profere comentários como este nunca ouviu falar da sucção não nutritiva. “Chuchar” no peito para se consolar, acalmar, restabelecer é tão importante para o bebé quanto o mamar para se alimentar. Ah e outra coisa, é a chucha que imita o peito e não o peito a chucha. Portanto “mamar” na chucha será o mais correcto.

- O teu filho tem quase três anos e ainda mama? Isso dá alguma coisa?

“Da última vez que vi dava Coca-cola”, era assim que respondia a Sofia cada vez que lhe perguntavam se ainda dava de mamar.

Há quem critique os pais de bebés com três anos que ainda mamam mas depois oferecem doces quando os vão visitar. O que é que se passou aqui para haver uma inversão de valores tão acentuada nomeadamente nas questões da alimentação? O açúcar faz melhor aos nossos bebés do que o leite materno? 

E pessoas que se metem nos assuntos das mamas das outras por tudo e por nada? Quando comuniquei na empresa o tempo que ia ficar de licença, um colega logo me perguntou se eu achava que ia dar leite durante esse tempo todo, uma vez que lhe parecia que eu não tinha o peito muito grande…  

Minha gente, peito é fábrica não é armazém.

Daí que se tivesse de criar o terceiro mandamento da visita a um recém-nascido ele seria: Não meterás o bedelho em mamas alheias.

E meter o bedelho é também pedir (ou nem chegar a pedir) para ver o bebé a mamar. Esta situação é tão fácil de resolver com bom senso… Se a mãe não se importar que a vejam vai dar a mama à vossa frente. Se se ausentar é porque não quer mirones. Neste caso escusam de pedir para ver.

Ainda sobre a amamentação tardia dizia-me uma amiga que achava que para uma mãe querer amamentar até tão tarde algum prazer ela tem de ter.

De facto, o ser humano tem prazer em diferentes actividades como comer, dormir, relaxar e, porque não, amamentar. A hormona da felicidade, a ocitocina já aqui falada numa crónica anterior, não só está presente num orgasmo como na amamentação. O que não quer dizer que a mulher tenha um orgasmo cada vez que amamenta, da mesma forma que pode não ter ao comer um chocolate ou um cozido à portuguesa, se for o seu prato favorito… 

Esta questão coloca-se mais assiduamente nos nossos dias por causa da erotização dos seios femininos. Antes de assentarem bem num decote, eles foram delineados para amamentar bebés, é por isso que eles existem, nunca se esqueçam disso.

Antropologicamente falando, uma das razões pelas quais chegámos até aqui como espécie humana foi a amamentação “tardia” até cerca dos sete anos. No início dos tempos era comum amamentar as crias quando elas já tinham os dentes todos na boca! Ou alguém desse lado ainda pensa que há milhões de anos havia fórmula, biberões, pescada cozida e javali tenrinho e desfiado no “prato” a tempo e horas?

E as minhas queridas senhoras, o que pensam da amamentação?

Até para a semana com o tema do choro.

Já de seguida, as crónicas anteriores.

Paula




Nota: ilustração de Nathalie Jomard. Título: The First Time You Breastfeed Is Unforgettable

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