Uma banheira na cozinha




Queridas Senhoras,

há pouco tempo escrevi aqui sobre Os Interessantes, um livro que acompanha a vida de um grupo de amigos em Nova Iorque ao longo de quatro décadas. Há alguns pontos de contacto com A Visita do Brutamontes (a mesma cidade, a indústria musical) mas este último é mais ambicioso (venceu o Pulitzer em 2011).

Em vez de uma narrativa linear sobre o que acontece a meia dúzia de pessoas ao longo do tempo, há uma galeria de personagens que encontramos em diferentes épocas, contextos e pontos de vista. Em cada capítulo uma personagem assume o controlo da narrativa. Muda o estilo e o tom, quem antes era secundário passa a protagonista, quem antes conhecemos de raspão assume uma maior relevância. Aos poucos, vai-se formando a teia de relações entre toda esta gente.

Alex, um jovem acabado de chegar a Nova Iorque, conhece Sasha, assistente de Bennie Salazar, produtor musical, casado com Stephanie, irmã de Jules, jornalista, e freelancer na empresa de La Doll, relações públicas, mãe de Lulu…e por aí fora. Há outros ainda, muitos mais, em diferentes lugares. Lou, mentor de Bennie, num safari em África. Bosco, o frenético e esguio guitarrista dos Conduits, uma banda que fez sucesso, a tentar voltar à ribalta muitos anos depois, obeso e à beira da morte. Ted, o tio de Sasha à procura dela em Nápoles. Kitty, estrela de cinema, atacada por Jules no Central Park e enviada por La Doll a um regime ditatorial como forma de humanizar a imagem de um temido general.

No início do livro, Alex visita o apartamento de Sasha e fica fascinado com a banheira na cozinha, esse detalhe arquitectónico tão novaiorquino, tão próprio de uma época. Imagina que daí a muitos anos terá uma recordação difusa de toda essa noite, irá esquecer a rapariga e os pormenores. Vai restar apenas a banheira na cozinha de um velho apartamento no Lower East Side.

Entretanto o tempo passou, passa, sempre a zumbir («o débil rumor que estava sempre lá»). Pessoas cresceram, tiveram filhos, casamentos, divórcios, apaixonaram-se, trairam, fugiram, regressaram, envelheceram, mataram-se, morreram, nasceram.

«E o zumbido, sempre aquele zumbido, que afinal talvez não fosse um eco, mas o som do tempo a passar.»

Beijinhos a todas,
Céu

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