Hiper irreal




Queridas Senhoras,

não tenham pressa em ler o meu post. Nada do que eu possa escrever aqui sobre estes quadros se equipara à sua fruição.

Não acham estranho que, a uma pessoa como eu, a uma pessoa que constrói realidades alternativas com a mesma naturalidade com que respira, a uma pessoa para quem as coisas nunca, nunca são apenas aquilo que parecem, seja a pintura hiper realista que lhe sustenha a respiração? Começou com o Hopper e nunca mais parou.

Há um quadro na minha cabeça à espera do dia em que nunca o vou pintar, por completa inépcia. Quando descobri estes dois quadros do sr. Philip Barlow, reconheci neles uma versão inteligente e sofisticada das imagens toscas que o meu cérebro procura aperfeiçoar há anos, na esperança de que talvez, um dia... tolices.

Esta mulher olha para trás, um último momento para olhar o que deixa para trás, terreno familiar, gasto de tanto pisar e repisar, onde, mesmo assim, parecem subsistir trilhos virgens. Este homem olha para a frente, para o inóspito terreno do desconhecido, do que lhe é estranho, do que se lhe oferece, do que receia, mesmo que o deseje.

Mas nós vemos o que nós vemos. Eu vejo o que eu vejo, um borrão enevoado pela condição de ser eu a ver. Nenhum de nós poderá, alguma vez, ver o que eles vêem quando olham para trás, para a frente. Nada do que eles vêem existe para nós.

Agora, o que eu faço com os borrões que vejo no lugar das memórias, das expectativas, das pegadas deixadas e por deixar, das visões dos outros, bem, o que eu faço é construir realidades alternativas e, num dia bom, escrever sobre elas.

Se calhar é isso. Se calhar é hiper irrealismo, o que eu faço.

E vocês, o que fazem com os borrões?

Beijinhos,

Marta

Comentários

  1. Bom dia Marta, que engraçado, sabes?, comecei a semana a ler uma crónica intitulada "Hiper-realismo" (de Paulo Varela Gomes, na revista do Público, não sobre pintura mas sobre escultura hiper realista). Termina assim: "o esforço do artista para conseguir que a realidade dos sentidos brilhe como um breve relâmpago na noite do real”.
    Depois dei com o teu maravilhoso post e com estas imagens belíssimas que não conhecia.
    E agora acabo de ler a sinopse da peça "Londres" que estreia amanhã no Teatro Aberto (texto vencedor do Grande Prémio do Teatro Português em 2011"):

    “Uma família
    parte em viagem à procura de uma saída. Uma cidade: Londres. Uma cidade conhecida que se tornou estranha e fria, aos olhos de quem empurra a porta a medo e entra.
    Uma mulher
    escreveu sobre essa viagem, sobre o pai e a mãe, sobre si própria, escreveu para entender, para dar sentido ao que se passou nas suas vidas.
    Hoje
    vem ter connosco ao teatro. Escolheu o palco para nos contar essa história, a história da sua família, um pedaço de vida, repleto de memórias, afectos e emoções."

    Ora mais uma vez se prova que isto anda tudo ligado :)

    beijinhos

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