O escritor

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Foto:  Livraria Lua de Marfim

Queridas Senhoras,

dos grandes festivais literários internacionais à mais obscura sessão numa biblioteca dos subúrbios, espera-se que o escritor nos agarre com uma daquelas tiradas lapidares. Que nos emocione, que explique o sentido da vida, que nos faça sentir bem (ou mal), que nos revele uma verdade qualquer.

Parece que no início deste mês Matilde Campilho arrebatou a plateia em Paraty com um discurso que a imprensa resumiu e puxou para título:  “A poesia não salva o mundo. Mas salva o minuto”. Que é como quem diz vive-se melhor com poesia do que sem ela. Isto dito no jeito luso-carioca da moça que impressionou toda a gente com a nova linguagem do seu Jóquei, lançado em 2014.

A pequena plateia que ontem se reuniu na Biblioteca Municipal Piteira Santos, para mais um encontro do Clube Literário da Amadora, não esperava, naturalmente, nenhuma frase bombástica capaz de dar título de jornal. O próprio convidado, o escritor João Tordo, quando instado a responder a uma pergunta de teor mais filosófico, disse que “não íamos salvar o mundo às dez da noite da Amadora”. (É notável como não há figura que venha a Amadora e não faça uma piada sobre o facto de estar na Amadora. Mas compreende-se. É irresistível. Nós, os que somos da Amadora, fazemos isso constantemente).

Ainda assim, apesar de estamos na Amadora, João Tordo falou de separação. Da ilusão que é pensarmos que estamos todos separados por um monte de coisas, muito metidos dentro do filme incessante das nossas cabecinhas, alimentando medos, irritações, raivas, ódios. Pensando que tudo nos afasta dos outros, querendo que eles sejam de outra maneira e sentido raiva por não serem. E vivendo assim anos e anos. Anos e anos.

Não estou a dizer que isto é uma grande mensagem. O João Tordo não é dos meus escritores preferidos (Mas estou disposta a dar uma hipótese ao novo livro). Mas, numa sessão obscura nos subúrbios, o escritor procurou satisfazer a ânsia de respostas. Digam lá se até não dava um título de jornal?

"Não estamos separados".

Beijinhos a todas,

Céu

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