Rissóis e trigonometria

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A cantilena do Teorema de Pitágoras - a mais persistente memória que restou das matemáticas escolares

 

Só então se deu conta de como eram escassas as competências que tinha adquirido na Universidade. Não havia vagas para bacharéis em estudos religiosos.
O Enredo Conjugal, Jeffrey Eugenides (pp.185) 


Queridas Senhoras,


de vez em quando, o MEC saca uma daquelas crónicas em que se resolve a partilhar com os leitores um segredo gastronómico bombástico, revelando onde se come o melhor pão, frango assado, rissol ou chamuça. Faz o elogio babado da cozinheira ou do cozinheiro, rende-lhe a devida e sentida homenagem e fica a rezar, pedindo que rezemos com ele, para que aquele bem sempre dure.

Sou muito sensível a estes textos, tenho um respeito imenso e reverencial por quem amassa e coze um pão magnífico ou faz uma fornada de rissóis de ir às lágrimas. É aquela admiração de quem é incapaz de fazer seja o que for com as mãos, o espanto perante o poder da criação, seja de comida, objectos ou arte. E também o poder de resolver problemas concretos, reparar máquinas, encontrar soluções.

Não sei fazer rissóis nem chamuças, não sei arranjar a máquina de lavar ou o esquentador, torradeiras são um mistério, montar móveis não contem comigo, carros desconheço em absoluto todo o seu funcionamento. Felizmente, o meu filho ensinou-me a usar o comando da TV. Não tenho receio de trabalho braçal, chamem-me para mudanças, subo e desço escadas, carrego caixas sem queixume. Tenho bom corpinho. Mas as mãozinhas são manápulas. Tudo o que exija técnica ou perícia é uma desgraça.

O mesmo se passa em relação a problemas matemáticos. A minha filha está no 6º ano e já não consigo acompanhar o que ela anda a estudar. Basicamente, tenho 42 anos e o que sei fazer é ler e escrever. A Alice veio mostrar-me o teste de Português e eu deliciada. Era sobre um excerto do Ulisses, obra que lemos há uns tempos cá em casa, e a sequência de perguntas e respostas causou-me verdadeiro prazer. Pensa, analisa, compara, sugere, caracteriza, reflecte, imagina, supõe. Que maravilha. De repente, tive inveja das belas aulas e matérias de Português e Filosofia que ela tem pela frente. Elabora, considera, esboça, denota, resume, explicita, define, explana, contrapõe, argumenta, discute.

Depois, a Alice perguntou se eu queria ver o teste de Matemática. E aí tive pena que o meu olhar já não consiga abarcar a beleza de uma equação, da decomposição de um número num produto de factores primos ou do apótema do pentágono.

Beijinhos a todas,

Céu

 

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