Queridas Senhoras,
professora e investigadora da Universidade de Aveiro, doutorada em Literatura, especializada em Literatura para a infância e juventude, com dezenas de artigos e livros publicados, Ana Margarida Ramos aceitou responder ao nosso questionário para leitores. Permitam-me que cite o que a professora escreveu há poucos dias nas redes sociais a propósito de uma polémica sobre o livro infanto-juvenil: «No caso em apreço, a comentadora não sabe o que é literatura infantil (...). Desconhece o que são as virtualidades do contacto com o maravilhoso ou o nonsense. Não percebe que um livro infantil tem vários níveis de leitura, não sabe que é um 'laboratório linguístico', o primeiro museu de arte visual que a criança visita, além de literatura de pleno direito.» Sou sensível a esta argumentação porque desde sempre procuro para os meus filhos livros com várias camadas de leitura. Acho deprimentes aqueles livros para crianças muito literais que não abrem portas para lado nenhum. Se as questões da literatura para a infância e juventude vos interessam, não deixem de estar atentos ao trabalho da professora Ana Margarida Ramos.
1. O que está a ler neste momento?
Estou a terminar o romance Os Loucos da Rua Mazur, de João Pinto Coelho.
2. O que leu antes e o que vai ler a seguir?
Antes, li O Novo Aluno, de Tracy Chevalier, e já tenho à espera O Luto de Elias Gro, de João Tordo.
3. Conte-nos uma memória de infância relacionada com livros
O meu avô materno era um extraordinário contador de histórias e contava algumas histórias tradicionais como se fossem histórias da sua vida. Contou-me muitas vezes a história «O velho, o rapaz e o burro», sendo ele uma das personagens. Conseguem imaginar o meu espanto quando, um dia, na aula de português, descobri o conto no manual? Cheguei a casa e confrontei-o com a «mentira» e ele, depois de pensar um bocado, disse que alguém o tinha ouvido contar a história e decidiu colocá-la num livro...
4. Que livros marcaram a sua adolescência?
Tantos, tantos. Quando olho para trás tenho a sensação de que passava o tempo a ler. Recordo O meu pé de laranja lima, Constantino guardador de vacas e de sonhos, Rosa minha irmã Rosa... Mas lia também as colecções juvenis da Verbo, li As Mulherzinhas, muitas adaptações de clássicos. Chorei com A cabana do pai Tomás e Oliver Twist. Pensando bem, marcaram-me quase todos os livros que me emocionaram.
5. Um local público onde goste de ler
Esplanadas e cafés. Adoro ler nas férias, numa espreguiçadeira, em frente a uma piscina.
6. O seu recanto preferido de leitura (em casa)
Cama.
7. Uma biblioteca importante para si
A minha, a Biblioteca Municipal de Ílhavo, porque é uma segunda casa, mas também a Biblioteca da Universidade de Aveiro, que tem uma luminosidade e um ambiente fantásticos, com vista para a ria e as salinas e, ao final da tarde, costuma oferecer aos leitores um pôr do sol como prenda.
8. As livrarias que costuma visitar
Digamos que não sou muito esquisita, porque gosto de livrarias e entro em quase todas as que me aparecem pela frente. Em viagem, não dispenso algumas emblemáticas, como a Hatchards, em Londres. Em Aveiro, a Gigões e Anantes, ou, em Braga, a Centésima Página são referências obrigatórias.
9. Uma editora de que goste particularmente
Gosto de várias: tenho uma ligação afectiva em relação à Caminho, a original, gosto muito do design cuidado da Tinta da China e da Alfaguara e acho os livros da Quetzal também objectos muito interessantes... Na Literatura para a infância, destaco a Planeta Tangerina.
10. Que livros gostaria de reler?
Alguns romances históricos que li para trabalhos académicos e dos quais não pude usufruir verdadeiramente como leitora. Todo o Saramago (novamente) e também alguns autores fetiche, como Almeida Faria, Paulo Castilho ou José Cardoso Pires.
11. Que livros está a guardar para ler na velhice?
Todos os que não conseguir ler até lá... Sou uma leitora pouco organizada, leio muitas coisas diferentes e ao mesmo tempo e não faço planos de leitura a longo prazo.
12. Acessórios de leitura que não dispensa
Marcador de livros. Pode ser improvisado, mas preciso sempre de ter um (ou vários) durante a leitura.
13. E se um livro não prende, põe-se de lado ou insiste-se?
Depende (acho que só se for muito mau!). Gosto pouco de abandonar a leitura de livros, porque sinto que fracassei enquanto leitora e eu sou muito perseverante.
14. Costuma ler sobre livros? Se sim, quais são as suas fontes?
Sim, até porque trabalho (ensino e investigo) sobre literatura. Tento estar a par da investigação sobre livros infantis, leio sempre os trabalhos da Maria Nikolajeva, da Betina Kummerling-Meibauer e de tantos outros que se têm dedicado a este segmento.
15. Uma citação inesquecível que queira dedicar às Senhoras da Nossa Idade
Gosto da epígrafe do livro A bibliotecária de Auschwitz, de Antonio Iturbe, atribuída a Faulkner:
«O que a literatura faz é o mesmo que acender um fósforo no campo, no meio da noite. Um fósforo não ilumina quase nada, mas permite-nos ver quanta escuridão que existe ao redor».
(cito de cor, não sei se fiel ao original)
(Que maravilha estas conversas, não acham? Fiquei com a imagem da biblioteca da Universidade de Aveiro, ao entardecer, com vista sobre a ria.)
Beijinhos a todas,
Céu
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